Por Leonel Brizola Neto
"A melhor recompensa, a sincera e justa homenagem a um
homem de valor, é seguir o caminho traçado por este, respeitar-lhe a memória,
defender a lógica dos seus atos, tornando assim, um espírito presente, à alma
do povo." (Luís da Câmara Cascudo)
Jean-Luc Godard, cineasta e crítico do imperialismo, dizia
que devemos comemorar o desaniversário daquilo que nos seria mais caro. O
desaniversário, ao contrário do que a primeira vista pode parecer, é a
comemoração permanente, o reavivamento constante em nossa memória dos nossos
heróis. Louvar diuturnamente os exemplos que valem a pena ser louvados,
transpondo-os a nossa ação. Infelizmente os personagens mais importantes da
história brasileira vivem de efemérides. Leonel de Moura Brizola não foge a
regra. Ano passado, nos dez anos de seu desaparecimento, foi lembrado,
cultuado, reverenciado, cortejado e, após o apagar das luzes dos fogos de
artifícios, deixado de lado. Getúlio Vargas, João Goulart e Leonel Brizola,
formam a jangada do trabalhismo. Quem quiser navegar por mares nacionalistas
tem necessariamente que manobrar essa jangada.
Quando governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola
percebeu que São Paulo se desenvolvia as custas do subdesenvolvimento de outras
regiões, especificamente o Estado que governava. Com argúcia ampliou esse
conceito e cunhou o termo perdas internacionais como a mola propulsora do imperialismo.
Os países ricos exploram os países pobres. O desenvolvimento gera o
subdesenvolvimento. No léxico brizolista entreguismo significa desfibramento,
traição ao país, aliança com os interesses das multinacionais e canalhice.
Nacionalismo ou entreguismo? De que lado se está? Essa é a pergunta seminal do
brizolismo.
A grande dicotomia da política brasileira atualmente está no
embate Lacerda versus Brizola. O legado brizolista trazendo no lombo a defesa
das riquezas nacionais e o liberalismo lacerdista privatizante abaixando a
cabeça ao capital internacional. Fazendo uma genealogia do lacerdismo moderno
temos no seu início a UDN que se metamorfoseou em Arena que após a
redemocratização se vestiu de PDS que depois virou PFL e, por fim, DEM. Um dos
políticos mais controversos do país, para ser elegante, passou por todos esses
partidos: Antônio Carlos Magalhães. Coronel na política baiana foi Governador,
Ministro de José Sarney e Senador. ACM se notabilizou pela sua amizade com o
grande magnata das comunicações Roberto Marinho, inclusive, quando Ministro das
Comunicações deu força para a Globo comprar a NEC em troca da retransmissora da
Globo na Bahia passar para suas mãos.
Em 1986, quando Brizola foi a única voz que se ergueu contra
a farsa do Plano Cruzado, o Governo Sarney, ACM e Roberto Marinho montaram uma
estratégia de propaganda que conseguiram fazer com que Moreira Franco vencesse
as eleições para o Governo do Rio, tendo como sua linha auxiliar o global
Gabeira que tirou votos do professor Darcy Ribeiro. Brizola foi acusado de ser
contra a estabilização dos preços que trouxe a miragem da redução da inflação.
Brizola estava certo e mais uma vez a verdade histórica saiu derrotada.
Se ACM descende de Lacerda e se o DEM descende do PFL, cujo
o maior nome era ACM, como fundir DEM com o PDT sem rasgar o passado, as lutas,
as tragédias pelas quais foi forjado o pensamento político mais belo do Brasil?
O suicídio de Vargas, a encampação da ITT e Bond & Share, a Campanha da
Legalidade, a Golpe de 64 que derrubou João Goulart, o espetacular direito de
resposta de Brizola no Jornal Nacional foram em vão? É de uma
irresponsabilidade inadjetivável essa brincadeira de mau gosto. Não dá para
fundir Brizola e Lacerda. Não dá para criar a síntese dialética entre nacionalismo
e entreguismo. Isso é tripudiar sobre a memória de Brizola. É nas entrelinhas
dizer que toda a sua luta foi uma aventura sem importância. O que está por trás
dessa movimentação? Quais os interesses que se escondem nessa ideia abominável?
Barganha por cargos? Ocupação de fatia do poder para satisfazer vaidades?
A defesa do Brasil está acima de vantagens pessoais.
Comemoremos o desaniversário de Brizola todos os dias levando adiante sua
práxis política. O mínimo que se espera de quem está à frente do partido que
Brizola construiu depois que lhe roubaram, sordidamente, a sigla do PTB é que
respeite sua história.
Em tempo: o PDT só é pequeno para quem o faz pequeno.
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