(*) Osvaldo Ventura
Pela inexistência atual de comunista
devorador de criancinhas, a elite brasileira, eterna adversária irracional e
raivosa de governos com viés popular, trocou de estratégia. No passado,
aterrorizava as massas com o fantasma do comunismo ateu, que viria provocar a
dissolução da família, a extinção da propriedade privada e causar a divisão de
tudo, para estabelecer o caos. Projetava-se, então, no âmbito das camadas
desprovidas de informação, no meio dos inocentes- úteis e analfabetos
políticos, que o apocalipse estava sendo trazido no ventre do comunismo
destruidor.
Hoje, com um governo trabalhista no Brasil
e sem o “fantasma” do comunismo, era necessário substituir os velhos,
desgastados e anacrônicos argumentos pretéritos. Então, surgiram novas
alegorias de um antigo enredo, sem o ranço do anticomunismo, porém com maior
capacidade de difusão do reacionarismo, manipulação dos crédulos, dos incautos
e ingênuos, distorção dos fatos, disseminação das aleivosias e transformação
das mentiras absurdas em verdades absolutas. Tudo isso com a participação
danosa e ostensiva do poder incontrastável das corporações midiáticas, de
propriedade das classes dominantes nativas, quiçá, as mais conservadoras e
coléricas ao Sul do Equador. Ressalte-se que é histórica a rejeição, por parte
das classes dominantes brasileiras, de um presidente da república que venha
demonstrar a mais leve vocação trabalhista.
Neste momento, coerente com seu passado de
querer assumir o poder utilizando-se de
métodos heterodoxos, a burguesia nacional assesta suas baterias contra
as políticas públicas de inclusão social, praticadas por um governo de
tendência popular, que dentre outras proposições, destacam-se aquelas que
pretendem diminuir as injustiças e desigualdades sociais reinantes no seio das
comunidades mais carentes.
Com a atual mudança das condições objetivas,
a burguesia nacional entendeu que havia necessidade de substituir o
desacreditado discurso de ontem por outro, no qual o caráter ideológico ficasse
menos explícito. Assim, o pavor difundido por uma hipotética implantação do
comunismo no Brasil, transformou-se em um moralismo hipócrita, numa recusa
preconceituosa em admitir a “ousadia ascensional dessa gente”, como também em infundado receio da perda de privilégios históricos
que não se coadunam com princípios da cidadania. O que, diga-se de passagem,
por mais que pretendessem disfarçar, só veio reafirmar o eterno conflito de
classes, trazendo para o centro da arena o inevitável embate ideológico.
Na verdade, a insensibilidade oceânica que
domina (com as exceções da regra) quem detém os meios de produção no Brasil
deve ser fruto do patrimonialismo atávico da Casa Grande, na qual a compaixão e
o olhar solidário jamais tiveram abrigo. Desse modo, explica-se porque uma
pessoa que desfruta de situação confortável do ponto de vista
econômico-financeiro, não tenha o mínimo sentimento de solidariedade para com
aqueles que vivem na miséria, à margem do processo civilizatório.
(*) Escritor
Membro
da Academia Feirense de Letras