segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

A GRÉCIA DE JOELHOS

Por (*) Osvaldo Ventura

Ironicamente, o chamado “berço da democracia”, a Grécia, foi o primeiro país no mundo a sofrer um explícito golpe de estado financeiro, desmoralizando ainda mais o secular conceito de democracia representativa. Neste novo ciclo do capitalismo mundial, o clássico golpe de estado executado a manu militari, com seu corolário de destruição, terror, sangue e morte, vem dando lugar ao golpe branco perpetrado pelo capital financeiro da doutrina neoliberal, mas não menos funesto que a tomada do poder pelas armas.

Sem qualquer respeito à soberania dos helênicos, a “banca mundial” (que dizem representada pelo grupo norte-americano Goldman Sachs) humilhou aquele país e impôs, à revelia de seu povo, um primeiro-ministro tecnocrata, um executivo de luxo, completamente desvinculado dos interesses políticos nacionais e lídimo testa-de-ferro do capital apátrida. Quando ainda indicado para assumir o cargo, causou perplexidade e revolta a seus mentores, porquanto, inexplicavelmente, foi acometido de um acesso de democracia e sugeriu submeter a um referendo popular as propostas de arrocho fiscal para a nação grega. Uma verdadeira heresia para os ditames da nova ordem econômica dominante. Foi rechaçado imediatamente pela “banca” e recolheu-se a seu papel de marionete movida pelos cordões de seda das grandes corporações financeiras, em cujo receituário, nem como mero detalhe o povo existe. A “audácia” quase lhe custou o cargo!

Com efeito, o Estado do Bem-Estar Social (Welfare State), que surgiu na Europa Ocidental com o intuito de contrapor-se ao comunismo da então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), não resolveu o problema do povo europeu. Mas, não se podem negar as várias conquistas sociais resultantes da interação entre povos e governos daquela região. Entretanto, essas conquistas estão agora ameaçadas, na medida em que a besta-fera do neoliberalismo, montada no capital financeiro, faz pouco caso da pobreza no mundo, invadindo as nações e lhes confiscando o futuro e a soberania, a título de pagamento de dívidas espúrias. Lamentavelmente, com o conceito neoliberal do “estado mínimo”, da “supremacia da mão invisível do mercado,” da falácia de que “o estado não existe para distribuir renda,” os menos favorecidos de todos os quadrantes ficaram entregues à própria sorte, ou melhor, aos desígnios do deus-mercado. Em verdade, o mercado é o melhor ente para produzir renda, porém, é tarefa essencial do Estado distribuí-la, no seu incessante desiderato em busca da justiça social.

Lastimavelmente, o que se constata hoje é a volta do laissez-faire, turbinado pelos “rentistas” do capital estéril e selvagem, protagonista da maior concentração de renda jamais vista na denominada civilização moderna. E salve-se quem puder!

(*) Escritor

Membro da Academia Feirense de Letras

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