Com o título acima, mais uma
crônica do acadêmico Antônio Moreira Ferreira, o Antônio do Lajedinho, sobre a
Feira de Santana e que vale a pena ler de novo:
- No limiar do século XX, o
Cemitério Piedade, sob a administração da Santa Casa de Misericórdia, era o
único na cidade. Apesar de pequeno, era suficiente para abrigar o pouco número
de féretros de então, e ainda se dar ao luxo de discriminar os indigentes e
pagãos.
A largura da fachada era a mesma
que a atual, mas a medida da frente ao fundo era de um terço, aproximadamente,
do que é hoje. A parte de campas perpétuas terminava ao lado da capela, onde
havia um ossuário em forma de Iglu onde eram jogados os ossos de indigentes e
daqueles que pagavam somente o aluguel de dois anos.
O ossuário era chamado de “vira
mundo”. Não sei se aquele nome foi atribuído pelo formato do globo terrestre ou
se referia aos pobres que estavam discriminados.
Quem não era nem rico nem pobre,
o que chamamos de classe média, tinham ainda a opção das carneiras (gavetas nas
laterais internas). Mais abaixo da capela, vinha a parte onde eram alugadas as
sepulturas por dois anos e, dividido no fundo por uma cerca, a parte
exclusiva a indigência e leprosos.
Ainda dentro daquele cercado,
havia uma pequena parte separada para enterrar mortos que não fossem católicos,
então considerados pagãos.
Não existiam velórios públicos e
cada morto era velado em sua própria casa. Também não existiam carros
funerários e o féretro, no esquife, era carregado por amigos e parentes de casa
ao cemitério, com passagem pela igreja.
Os sinos badalavam com o toque
especial de finados desde o momento que o “enterro” saía de casa até a chegada
à igreja. Para quem era rico, celebrava-se a missa de corpo presente na própria
Igreja. Para quem não podia arcar com as despesas, a demora era pouca.
Na época em que houve a peste
bubônica, nenhuma vítima da doença tinha o direito de entrar na Igreja, e o
sepultamento era feito na parte dos leprosos.
No local para os não católicos,
enterravam-se sempre os ciganos, e vítimas de suicídio, se pobre, vez que não
existia outra religião na cidade.
Havia aqui em Feira um mendigo,
bêbado que, certa vez, sentiu-se mal, desmaiou e foi levado para a Santa Casa
de Misericórdia. Lá, um médico constatou que o paciente estava morto. Na
verdade ele tinha sofrido um ataque de catalepsia e o médico não identificou.
Era costume da época, a Santa
Casa emprestar um caixão para levar os féretros de indigentes até a sepultura
onde o corpo era depositado e o caixão devolvido. Assim fizeram para levar o
bêbado até o cemitério.
Mas quando chegaram ao caminho o
defunto mexeu-se com violência e os carregadores soltaram o caixão que se
espatifou no chão, saindo então, atônito, o mendigo. Vendo-se sozinho, saído do
caixão, resmungou:
- “Teja onde tiver, é um bom
lugar, porque aqui tem bodega.” Assim partiu para a bodega próxima. Como o dono
refugiou-se com medo do morto, ele serviu à vontade, da cachaça existente.
Conheci-o nos idos de 32, velho, com o apelido de “Já morreu”. (Adilson Simas)




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