Os 110 anos de
nascimento do filósofo francês, Maurice Merleau-Ponty, completados em 2018,
motivaram o professor e pesquisador Monclar Valverde a lhe fazer uma “discreta”
homenagem e uma provocação histórica aos demais pesquisadores de sua obra, com
a publicação de “A Instituição do Sensível”, seu mais novo livro. A publicação
foi lançada inicialmente em São Paulo, no restaurante Soteropolitano e mais
recentemente, em Cachoeira, na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
(UFRB), durante o IV Congresso Internacional sobre Culturas: Memória e
Sensibilidade: cenários da experiência cultural contemporânea.
A principal inspiração
de Monclar Valverde, do ponto de vista intelectual, é, sem dúvida, o pensamento
de Merleau-Ponty, a quem ele classifica de filósofo ímpar, por aliar
curiosidade, originalidade e cuidado no trato com as questões mais difíceis.
Apesar de nem sempre ter tido o reconhecimento da filosofia acadêmica, sua obra
vem sendo cada vez mais pesquisada em diversos âmbitos e em variados campos de
expressão.
O livro reúne textos
produzidos e publicados pelo autor, nos últimos dez anos, em revistas e coletâneas
acadêmicas. Nele, Monclar Valverde desdobra, aprofunda e ilustra sua própria
abordagem das tradicionais problemáticas da comunicabilidade afetiva e da
sensibilidade, desenvolvidas pela filosofia e as ciências sociais.
A publicação é apresentada em duas partes nas
quais se desdobram, entre outras questões, os acordos culturais que regem a
sociedade, bem como o papel da
instituição como base de toda a experiência humana. Na segunda parte, temos um
autor que testa seus pressupostos conceituais exercitando a interpretação da
expressão plástica no plano visual, como também no gestual e musical; e do
discurso crítico, ao tempo em que procura mostrar o quanto a experiência
estética é configurada pela história da própria expressão poética.
Entre os temas tratados
pelo autor, destaca-se a sensibilidade entrelaçada com a coexistência e a
mundanidade. O mundo sensível não está
dissociado da praticidade, como pode parecer á primeira vista. Muito pelo
contrário, estão intimamente ligados. Valverde entende que, não só por isso, é
que se pode falar do mundo sensível e da percepção em termos históricos, como
efeitos de um trabalho constituinte.
Arte
e bom gosto
A arte e seus
desdobramentos nas suas mais variadas linguagens, como a pintura, a música e a
fotografia, é também objeto da observação do autor. Ele considera que a
fotografia é um dos mecanismos que, procurando imitar o olhar, proporciona a
quem vê um acesso indireto ao processo da visão. Seja na foto posada ou no
instantâneo, a reprodução fotográfica coloca o objeto fora do alcance do
movimento, transformando-o em espetáculo que exige contemplação. “Olhando uma
foto, olhamos para o que alguém viu, em um determinado momento e de uma
determinada perspectiva”, acrescenta.
Valverde
refere-se a algumas técnicas fotográficas, com as quais ilustra trabalhos do fotógrafo Élcio Carriço, que
“nos ensina a olhar para a festa, celebrando a festa do olhar”, numa alusão ao
Carnaval de Salvador, onde o fotógrafo capta a vibração da festa com a câmera
em movimento. E acentua que, por seus efeitos, a poética dessa pintura
fotográfica remete ao impressionismo e até descobre nas sugestões cromáticas
dessas telas, algo do maneirismo de Monet, de Renoir e Degas. Ele traz ainda para discussão a questão do
gosto, não o gosto dos sentidos, o paladar, mas o gosto como expressão
estética, o bom gosto enquanto apreciação do belo.
Um aspecto que chama a atenção
do leitor, é, sem dúvida, o modo como o autor descreve um dos textos de Merleau
Ponty, concebido para ser “apenas” um prefácio, mas que contém nada menos que
52 páginas. Embora extenso, nunca foi publicado como ensaio original. Serviu mesmo como prefácio de Signes, o último dos seus livros
publicados em vida.
Além de tratar
sobre fatos que assinalam os descaminhos do comunismo, o texto é também uma
síntese dos seus grandes temas: a percepção, a fala e a ação. Trata-se de um
balanço intelectual da produção e das escolhas feita por ele. “É ainda o
testemunho de uma época em que a política costumava ser uma atividade
intelectual e em que os intelectuais se comprometiam com a política”, pontua Valverde.
O livro traz
ainda traduções de ensaios de Merleau-Ponty.
São resumos de cursos ministrados por ele no Collége de France, nos
quais se propõe a discutir, entre outros assuntos, O Mundo sensível e o mundo
da expressão; Materiais para uma teoria da história; A “Instituição” na
história pessoal e pública e O problema da passividade: o sono, o inconsciente
e a memória.
Monclar Valverde é
doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1996), com
pós-doutorados em Teoria da Comunicação (Paris V Sorbonne, 2002: Filosofia
(UFPR 2008) e Estética da Comunicação (UFRB, 2018). É autor dos livros Militância e Poder, (1998);
Objetos de Papel (2000) e Estética da Comunicação (2007), reeditado como Breve
Fenomenologia da Expressão e Pequena Estética da Comunicação (2017), como
também das coletâneas As Formas do Sentido (2003), Merleau -Ponty em Salvador
(2018).
É Professor Titular do
Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da Universidade Federal da Bahia
(IHAC-UFBA). Tem atuação marcante como compositor, cantor e instrumentista amador.
,Lançou os CDs Metemorphoses du Silence (2002), Word Music (2003) e Cinema
Imaginário (2004). Mais recentemente tem atuado com o grupo Mínima Música, com
o qual lançou os CDs DEMO Valentine’s Day
e Estranhamente Familiar, ambos de
(2014). Está concluindo a gravação de seu repertório para piano solo a ser
divulgado no CD Exercícios de Melancolia (novas canções sem palavras). (Por Socorro Pitombo)
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