JANEIRO lembra a realização da ultima
feira-livre no centro da cidade na segunda-feira, dia 10 e a primeira no Centro
de Abastecimento na segunda-feira seguinte, dia 17. Vamos viajar no tempo e lembrando
esses fatos históricos.
DEPOIS de quase quatro anos de intensa luta
que começou com a desapropriação da área seguida da aprovação de um empréstimo
junto ao BNB e a celebração de contrato com a Construtora Norberto Odebrecht,
em novembro de 1976 o prefeito José Falcão inaugurou no antigo Parque Manuel
Matias a primeira etapa do Centro de Abastecimento, denominado “Projeto
Cabana”, concebido pelo engenheiro Lindalvo Farias, obra “menina dos olhos” do
saudoso alcaide.
VIVIA a cidade a agitação de mais uma
disputa eleitoral (Colbert Martins, do MDB versus Ângelo Mário, da Arena) e
logo a inauguração, no domingo, 7 de novembro, véspera do eleitor ir as urnas, foi
transformada em ato político em favor do candidato emedebista.
AINDA no dia anterior milhares de
jarras foram distribuídos e durante todo
o dia o povo bebeu chopp ao som de muita musica, samba de roda, duelo
de
trovadores, maculelê e outras manifestações culturais bem ao estilo “Zé
Festinha”, como era carinhosamente chamado o prefeito. Também na véspera os
arenistas se reuniram numa chácara nas vizinhanças da cidade, montando a
estratégia para contrapor a festa dos adversários.
ASSIM foi feito. No momento maior da
solenidade, enquanto os oradores discursavam exaltando a obra, um avião
sobrevoava a cidade, derramando por toda a área do Centro de Abastecimento
milhões de panfletos que diziam:
-
A obra do Centro de Abastecimento será paga por Ângelo Mário que no dia 15 será
eleito novo prefeito de Feira de Santana
FEITA a inauguração e passados os festejos de Natal e Ano Novo, na
manhã de terça-feira, 4 de janeiro de 1977, o prefeito reuniu a imprensa e
anunciou que no dia 10, segunda-feira, aconteceria a ultima feira-livre nas
ruas da cidade e que no dia seguinte todos os barraqueiros seriam deslocados
para o novo local. Falcão começou pedindo confiança e pregando otimismo:
-
“A palavra que dirijo aos feirantes é de confiança, que eles confiem em nós,
como confiamos neles, pois o valor do CA, antes de ser utilizado, já está evidenciado. Há feirantes,
usuários de boxes ou de açougues no
mercado que já negociaram o seu lugar...”.
CONFORME prometido, a última
feira-livre pelas ruas da cidade acontece na segunda-feira, 10 de janeiro, hoje
completando exatos 33 anos.
NA ÉPOCA, ela já não era mais apenas a
feirinha em volta da capelinha de Santana como contam alguns historiadores, nem
aquela dos tropeiros, dos boiadeiros, dos vaqueiros e dos mascates como nos
tempos idos.
JÁ ERA a grande feira-livre da Feira
de Santana, dentro e em volta do mercado construído em 1914 e também ocupando toda
Praça João Pedreira, parte das ruas Sales Barbosa e Marechal Deodoro e quase
toda extensão da Avenida Getulio Vargas, envolvendo feirantes, usuários e
turistas.
APÓS a última feira realizada sob fina
chuva que caiu na cidade durante todo o dia, além do noticiário normal da
imprensa, também choveu artigos e declarações de personalidades, contra e a
favor da mudança.
PARA o poeta Franklin Machado, “A feira se despediu sem solenidade. Como um
general que ganhou a guerra e se aposenta sem querer receber nenhum louro. Como
um filósofo que sabe serem essas coisas efêmeras. O que vale é o registro
histórico”.
CONTRA a mudança, o jornalista e
advogado Helder Alencar pregava que ela precisava apenas de higienização e
disciplina quanto aos dias e horários de funcionamento. E escreveu:
“Assim,
se a feira-livre era uma doença, ficaria curada. A dose de medicamento que lhe
deram, entretanto, foi forte demais e a feira da Feira de Santana morreu”.
DE MODO diferente, Franklin Machado,
também jornalista e advogado se inspirou na chuva fina que caiu no dia da
feira: “O tempo chorou, mas sabemos que amanhã é um novo dia. E o sol nascerá
radioso, brilhante. Logo, a feira não se acabou, apenas mudou de local...”.
TAMBÉM contra a mudança, o poeta Juracy Dórea
sentenciou: “Acabou a beleza e a poesia
da feira, sufocadas pela padronização”. O pesquisador e advogado Fernando
Pinto de Queiroz, seguiu na mesma linha: “O
que sobrará para a cidade? Nada. A feira é o que a Feira de Santana tem de
diferente e notável...”.
DE NOVO aparece o poeta Franklin Machado na outra
ponta exaltando o presente o antevendo
grande futuro: “A hora não é para
saudosismo nesta Feira que se industrializa, que se asfalta em ruas e estradas,
que se alteia, arranhando o céu”.
ADIANTE Franklin alerta: “Não vamos mais ficar a lamentar ou a rememorar fatos, uma vez que nós
feirenses somos gente portuguesas acostumadas a sair pelo mundo para criar
mundos”. E termina pregando
renovação: “Viver é estar sempre
mudando, se renovando. Quando se perde esta capacidade é a velhice e a morte”.
UM DIA após a última feira, a
Prefeitura iniciou a retirada das barracas do centro da cidade e a
transferência dos comerciantes do velho mercado para o Centro de Abastecimento,
ao mesmo tempo em que realizava os últimos trabalhos nas vias de acesso para o
novo local.
NO DIA 14, sexta-feira, as portas do
mercado foram lacradas e as chaves foram entregue pelo prefeito José Falcão ao
prefeito eleito Colbert Martins, que tomaria posse no dia 1º de fevereiro.
COM o velho mercado fechado, a feira-livre que também
acontecia aos sábado, já foi realizada no Centro de Abastecimento, ainda que de
forma improvisada. Na verdade, mais do que uma feira-livre, a feira daquele sábado,
dia 15, foi uma espécie de treino entre feirantes, usuários, turistas e
curiosos com vistas à grande festa em que se transformaria a feira da segunda-feira,
no seu novo local.
NAQUELE dia 17,
com a secular feira-livre das segundas-feiras sendo realizada pela primeira vez
no Centro de Abastecimento, um enorme vazio parecia tomar conta das ruas
centrais da Feira de Santana, sem que houvesse, entretanto, prejuízos para os comerciantes
dos mais diversos ramos de atividades.
DONO do maior e mais importante supermercado da cidade,
José Mendonça declarou: “A influência
positiva ou negativa nos nossos negócios é fator secundário. Importante é
acompanhar os novos tempos”.
MAIS detalhado foi o gerente da firma “Marrocos”, José
Carlos Morais Lima: “Houve uma reação
positiva, pois a cidade ficou desafogada e o pessoal que vem fazer compras nas
lojas nada tem a ver com quem vem comprar alimentos. Os negócios foram
positivos”.
NO DIA da primeira feira-livre no CA,
sem esconder a alegria pela vitória alcançada, o prefeito José Falcão percorreu
toda a área distribuindo abraços. Tão feliz que segundo o assessor ele teria brincado
com uma feirante vendedora de ovos residente em “Cascalheira”, no distrito de
Jaguara.
QUANDO a feirantes começou reclamar
que ainda não tinha localizado o espaço destinado para vender sua mercadoria, foi
abraçada pelo matreiro Falcão que lambendo os lábios disse brincado: - Se “iaiá” não sabe onde colocar os ovos,
que os ponha na cabeça...
POR FIM, mesmo com melhorias e ampliações no CA ao longo dos anos, muitos barraqueiros e
feirantes, principalmente de frutas e verduras, continuam instalados nas ruas centrais
desafiando as autoridades municipais. Sôbre essa realidade vale lembrar a profecia de
Franklin Machado que no seu artigo de 33 anos atrás, após a ultima feira-livre
previu esse comportamento com uma frase que agora repetimos encerrando o tema
de hoje:
- A feira teimará em ficar pelas adjacências como mulher apaixonada que não quer deixar seu homem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário