Por Adilson Simas
Depois de quase quatro anos de intensa articulação que começou com a desapropriação da área e a aprovação de um empréstimo junto ao Banco do Nordeste do Brasil, em novembro de 1976 o prefeito José Falcão inaugurou no antigo Parque Manuel Matias de Azevedo a primeira etapa do Centro de Abastecimento, o chamado “Projeto Cabana” concebido pelo engenheiro Lindalvo Farias, obra tida como “a menina” dos seus olhos.
A cidade vivia a agitação de mais uma disputa eleitoral (Colbert Martins, do MDB versus Ângelo Mário, da Arena) e logo a inauguração, naquele domingo, 7 de novembro, oito dias antes dos eleitores irem as urnas, foi transformada em ato político em favor do candidato emedebista, mesmo partido do chefe do executivo.
Milhares de jarras foram distribuídos
ainda na véspara e durante todo o dia o povo bebeu chopp ao som de muita
musica, bem ao estilo “Zé Festinha”, como era carinhosamente chamado o alcaide
municipal. Também na véspara os arenistas se reuniram numa chácara nas
vizinhanças da cidade, montando a estratégia para “melar” a festa dos adversários.
Não
deu outra. No momento maior da solenidade, quando os oradores se revezavam nos
discursos exaltando a obra, a tática foi
colocada em ação. Um avião, sobrevoando a cidade, derramava por toda a área do Centro de Abastecimento
milhões de panfletos que diziam:
-
A obra do Centro de Abastecimento será
paga por Ângelo Mário que no dia 15 será
eleito novo prefeito de Feira de Santana
A COLETIVA DE FALCÃO
-
“ A palavra que dirijo aos feirantes é de confiança, que eles confiem em nós,
como confiamos neles, pois o valor do Centro de Abastecimento, antes de
ser utilizado, já está evidenciado. Há
feirantes, usuários de boxes ou de
açougues no mercado que já negociaram o seu lugar...”.
-
“ Não haverá nenhuma alteração no calendário já estabelecido, mesmo com a chuva
prejudicando as obras de pavimentação das vias de acesso... ”
“REQUIEM PARA UMA FEIRA”
A
retirada lenta e desorganizada das barracas
durante toda terça-feira, 11,
ainda reflexo das chuvas que caíram na cidade, levou a edição do dia seguinte do jornal “Feira
Hoje” a
estampar na primeira página a seguinte manchete: “A Feira ainda não mudou-se: só
confusão”. Nas páginas internas, além de farto material sobre a ultima
feira-livre, destaque para o nostálgico artigo “Réquiem para uma feira”,
assinado pelo jornalista e poeta Franklin Machado que ao comentar a resistência
de alguns feirantes e usuários, exercitou seu estilo inconfundível no penúltimo
parágrafo:
-
“ A feira teima em ficar pelas adjacências
como mulher apaixonada que não quer deixar seu homem...”
Na quinta-feira, 13, o prefeito voltou a se encontrar com os repórteres que cobriamas atividades do executivo para afirmar que “os barraqueiros lotados no Mercado Municipal têm até sexta-feira para desocuparem o imóvel”, acrescentando que “pontualmente às 18 horas (sexta-feira, 14) o mercado será fechado e as chaves entregues ao novo prefeito (Colbert Martins, o prefeito eleito, assumiria no dia 1º de fevereiro). No mesmo encontro José Falcão deixou claro que no sábado, dia também de feira-livre, ela não mais aconteceria nos ruas do centro da cidade”.
Realmente,
no sábado, 15, as portas do velho mercado, construído na intendência do cel. Bernardino Bahia,
amanheceram lacradas...
A FEIRA NO “CABANA”
No
sábado, 15, a tradicional feira-livre daquele dia e que muitos diziam ser feita
apenas por gente da cidade (o pessoal da roça preferia a de segunda-feira),foi
realizada no Centro de Abastecimento, ou “Cabana”, como foi batizada a obra no começo. Mesmo com
muitas improvisações, a imprensa foi unânime
afirmando “Todos contentes com a
feira no Centro de Abastecimento”. Ao
jornal “Feira Hoje”, por exemplo, o ex-vereador Orlando Leite declarou que “estive lá na feira-livre para comprar
carne de carneiro e não achei, pois a venda é no açougue.No mais tudo bem, o
centro substitui a altura a velha e tradicional feira”. A esposa também ouvida pelo jornal, gostou
mas reclamou:
-
“Gostei imensamente da obra, agora o problema da ladeira para se subir com os
carregamentos é que aborrece...”
Na
véspara da primeira segunda-feira com feira-livre no Centro de Abastecimento,
na capa do “Caderno de Domingo” do
jornal “Feira Hoje”, o jornalista Helder Alencar que formava no grupo contra a
retirada da feira das ruas da cidade,
assinou o artigo “A Feira sem a feira” reafirmando sua posição mas reconhecendo
ser o fato irreversível. No longo texto que ocupou toda capa do caderno, depoimentos de outras
personalidades com
o mesmo ponto de vista do jornalista. Arquiteto, poeta e pintor, Juracy Dorea Falcão, por exemplo, foi taxativo:
-
Vão acabar a beleza e a poesia da feira, sufocadas pela padronização...
Na
segunda-feira, 17, Feira de Santana amanheceu com as suas ruas centrais vazias e a secular
feira-livre daquele dia sendo realizada , em clima de festa, no Centro de
Abastecimento, local antes conhecido como Parque Manuel Mathias de Azevedo.
Mesmo os comerciantes do centro da cidade foram unânimes nos elogios: José
Mendonça, do supermercado, afirmou que “a influencia positiva ou negativa nos
nossos negócios é fator secundário” e o diretor comercial Gemini Rolim disse
que “as vendas melhoram depois da mudança”. Gerente da firma “Marrocos”,
José Carlos Morais Lima detalhou: “Houve uma reação positiva pois a
cidade ficou desafogada e o pessoal que vem fazer compras nas lojas nada tem a
ver com quem vem comprar alimentos”. No dia seguinte o gerente foi novamente
ouvido:
-
Tanto sábado, como na segunda-feira os negócios foram positivos...
- Se “iaiá” não sabe onde colocar os ovos, que os ponha na cabeça...
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