‘Não chamam de esposa, e sim de companheira’
Há exatamente um ano, Daniela Mercury e Malu Verçosa deram o
“sim” que mudaria suas vidas. Em meio à coragem de externar seus sentimentos
para o mundo, veio uma série de julgamentos, mas elas também passaram a serem
vistas como ícones da luta pela liberdade. O encontro de almas, como elas
costumam definir, vai além da casa que elas moram com as três filhas adotivas
em Salvador. Malu passou a fazer parte da vida profissional da mulher , e as
duas afirmam viver, desde então, uma eterna lua de mel.
Como vocês avaliam esse um ano de casadas?
MALU: Foi um ano de aprendizado e muitos desafios. A
sensação é que valeu por dez anos de convivência. Começamos um namoro e depois
tivemos um casamento com muita exposição na mídia e muitos julgamentos e
comentários. Inventaram até separações! Nos fortalecemos e muito com tudo isso,
mas não foi fácil. Nos tornamos ícones da luta pela liberdade, contra o
preconceito e contra qualquer tipo de violência e desrespeito à comunidade
LGBT. Foi um ano de muita alegria, mas de muita pressão também.
DANIELA: Foram muitos momentos divertidos e emocionantes.
Viagens de férias para Paris, Dubrovinik, na Croácia, e muitas viagens pelo
Brasil a trabalho. Também recebemos juntas alguns prêmios de direitos humanos
pela nossa atitude. Nesse um ano, decidimos trabalhar juntas por que nos
admiramos profissionalmente e também pela intensidade da paixão (risos). Não
nos desgrudamos. Malu me protege e cuida muito de mim tanto profissional como
pessoalmente, marcando consultas médicas e organizando as coisas da casa. Ela
vai das coisas mais íntimas aos contratos e depois desse ano tão forte e intenso,
nos amamos muito mais.
Vai ter uma nova lua de mel?
DANIELA: Nós aproveitamos as viagens a Portugal (por causa
do “The voice kids”, em que Daniela é jurada) e já começamos a celebrar um ano
de casadas. Afinal, foi lá que anunciamos o nosso amor ao mundo. E vamos fugir
para o litoral norte da Bahia nesse fim de semana. A lua de mel é eterna.
MALU: A comemoração será só de nós duas. Queremos coisas
simples, como um lindo pôr do sol e jantar num restaurante que amamos.
Vocês já tiveram alguma briga de casal?
MALU: Temos discussões como qualquer casal, afinal de
contas, duas mulheres leoninas e líderes natas sempre têm uma forma diferente
de resolver os mesmos problemas.
Qual o segredo para manter a chama do amor acesa e não cair
na rotina?
MALU: O olhar sobre a outra. A admiração que temos uma pela
outra e a sedução que é diária e constante. O nosso jeito de ser mantém a nossa
vida bem movimentada e intensa.
Trabalhar ao lado da mulher é mais fácil?
MALU: É um desafio. E é extremamente gratificante, uma
delícia ter a companhia uma da outra diariamente, testemunhar a vida da pessoa
que você amada é maravilhoso.
O casamento de vocês serviu, como vocês mesmo disseram, para
ajudar na luta pela liberdade. Hoje, um ano depois, como vocês enxergam a
questão do preconceito?
DANIELA: O nosso amor inspirou as pessoas a lutar pelo que
acreditam e isso tem sido bem claro para nós. O impacto do que fizemos é muito
mais abrangente do que as questões do universo LGBT. Estamos orgulhosas pelo
fato de inspirarmos as pessoas a falar a verdade, a viver seu amor com
naturalidade. Nos sentimos muito queridas e recebemos muitos cumprimentos pela
nossa atitude e muitos agradecimentos pela luta contra o preconceito e pela afirmação
da força e da autonomia das mulheres. Um reforço bem importante à luta
feminista também.
Vocês chegaram a sentir esse preconceito na pele?
DANIELA: É cansativo, pois é preciso lembrar ao mundo, o
tempo todo, que somos casadas para que tratem a gente como tratam um casal
hétero. A sociedade não tem hábito de considerar a união de mulheres um
casamento. Então, nos restaurantes, nos hotéis e em praticamente todas as
situações cotidianas, é preciso sutilmente educar as pessoas. E ainda tem os
termos preconceituosos, não chamam de esposa, mas de companheira. Falam de
“assumir” e esclarecemos dizendo que não há o que assumir e que, no nosso caso,
apenas comunicamos a relação e depois casamos no civil como qualquer casal. Mas
não precisamos de aprovação, precisamos de respeito!
Em tempos de eleição, o que vocês acharam da vitória do Jair
Bolsonaro e Marcos Feliciano, dois ferrenhos críticos à causa LGBT?
DANIELA: Quanto mais a sociedade avança, mais barulho faz
uma minoria conservadora, principalmente num país em que crenças religiosas e
direitos humanos se confundem. A educação é o grande desafio.
As filhas de vocês já entendem que elas têm duas mães e que
vocês são um casal?
DANIELA: Claro que elas sabem que têm duas mães e que somos
um casal. Elas nos admiram e crescem com um exemplo de respeito, cumplicidade
e, principalmente, amor, entre as mães. A questão não é “tratada”em casa porque
não é uma questão. Elas não têm o preconceito que está dentro da nossa
sociedade. E quando vem alguma questão de fora para dentro de casa, em muitos
casos, elas mesmas encontram as soluções. Quando isso não acontece, a gente
conversa e mostra o caminho de resolução e do amor.
Pensam em adotar mais uma criança ou até mesmo engravidar?
MALU: O futuro a Deus pertence... Amamos crianças!
Como é o assédio das mulheres ao casal ?
DANIELA: O assédio é o mesmo dos homens. Ignoramos o assédio
e seguimos adiante. Não nos mobiliza. Somos igualmente ciumentas, mas nada
exagerado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário