domingo, 8 de janeiro de 2023

MUITO MAIS QUE DISPUTA ELEITORAL

 

Cada um a seu modo, a seu estilo, para seu público particular, petismo e bolsonarismo são insuperáveis no manejo dos símbolos. Não buscam uma adesão racional e calculada das massas às suas causas, porém algo mais visceral, atávico. Dialogam não com o suposto ser ponderado, bem-pensante e civilizado do terceiro milênio, mas com o humano mais profundo, que vem da pré-história, que vive em um mundo perigoso, cercado de inimigos, e precisa ser protegido pelos seus.

 É por essa lógica de acolhimento que é imprescindível tanto ao petismo como ao bolsonarismo a figura de um grande líder. De um lado, Lula, quase um arquétipo do condutor sonhado pelos intelectuais marxistas, que após uma vida de privações construiu sua liderança dentro de uma estrutura fabril e sindical. Do outro, um militar voluntarioso que se rebela contra o que considera um grande sistema que conspira contra a família, o país, e os valores cristãos.

A posse de Lula em 2023 é um exemplo perfeito dessa imagem alegórica. Um presidente que para tantos foi preso injustamente sobe a rampa do Palácio do Planalto, para a posse, ladeado de uma criança pobre, uma mulher negra, uma pessoa com deficiência, um velho cacique de uma tribo oprimida. A imagem é de uma carga emocional para muitos avassaladora, ainda mais em tempos de identitarismo. Não é razão, mas puro afeto, no sentido original do termo de afetar, de comover.

Bolsonaro não faz diferente, mas atua em outra dimensão metafórica. Seus símbolos estão no verde-amarelo da pátria, em descer um dia da rampa do Palácio carregando, com os braços levantados, uma imagem de Jesus Cristo; ao se deixa fotografar naquela mesa de café da manhã com garrafas plásticas de refrigerante e latas de leite condensado, de conversar todas as manhãs com os representantes do povo. O verdadeiro sujeito comum, ao mesmo tempo, herói defensor das famílias de bem.

É quase uma batalha de titãs em jogo a dividir o Brasil. De um lado a religião, a família e a pátria como espaços a serem protegido. Do outro, mulheres, pobres, vítimas da desigualdade. Trabalha-se com sentimentos enraizados em cada um. No bolsonarismo profundo fala-se de guerra pelos valores e civilização ameaçados. No lulismo, a retórica de defesa dos mais carentes contra a elite opressora (a questão da democracia teve a função mais de trazer para o mesmo lado quem não conseguia se identificar com nenhum dos dois – isso é assunto para outro texto). Mas é possível dizer que são grupos algo dogmáticos, avessos a questionamentos que não sejam internos e atuam na lógica da batalha. Costumam tratar os adversários como uma caricatura. Mais.


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