Texto
lido na Rádio Povo, programa Primeira Página, de 23 de junho de 2007
Neste dia da fogueira de São João, vou usar o tempo para fazer aquilo que muitos da minha geração certamente gostariam. Viajar no tempo e lembrar o São João da minha infância.
Da
minha infância aqui mesmo pelas bandas do Nagé, de Dona Cecília fazendo pamonha, do Minadouro
de Pedro Mendes oferecendo o melhor licor, de Baraúna de Lindu costurando a
roupa da festa, de Galiléia de Pombinha dizendo
a gurizada que “São João já chegou aqui”e do Sobradinho de Pedro Alexandre,
vendendo os famosos fogos da marca “Adrianino”.
No
São João daquele tempo a gente via as residências feericamente iluminadas,
adornadas de graciosas lanternas e longas fitas coloridas pelos corredores da
casa.
Do
São João daquele tempo guardo na memória a mesa bem forrada tendo sobre ela
pratos maravilhosos, de travessa, contendo morena e saborosa canjica – a rainha
da festa de São João, que tinha como seus seguidores os doces secos e de calda,
frutas variadas em profusão, comandadas pelas gostosas laranjas de umbigo.
No
São João de outrora, também presente na mesa a leitoazinha tostada, vaidosa
ainda, pois ostentava uma flor na cintura, parecendo namorar o porquinho
sizudo, mas cheiroso como um cravo, que também enriquecia a mesa farta.
No
São João da minha infância, o rei da mesa, no entanto, era o peru com seu papo
recheado, orgulhoso, desafiando os seus adversários gastrônomos, principalmente
as galinhas assadinhas, enfeitadas de tirinhas de papel, lembrando as garotas
que passavam em bandos usando chapeuzinhos coloridos.
No
São João de um passado distante tinha muita mais na mesa de todas as casas.
Tinha
queijos verdadeiros, o sublime doce de leite, o doce de caju. Tinha vinho,
tinha cerveja, mas tinha principalmente o licor de jenipapo sempre saboroso e
forte, que na mesa parecia bater papo com o licor de maracujá, certamente disputando
quem seria o mais consumido pelos convivas.
No
São João da minha infância, na frente de cada casa não existia apenas a fogueira assando milho, batata doce
e outros produtos típicos.
No São João da minha infância, na frente de cada casa além da cana com folhas, também recordo a arvore plantada, em cujos ramos colocava-se fitas coloridas de papel de seda, milhos, bebidas, laranjas, cocos e como aquele era um tempo bom, colocava-se também até dinheiro e tudo mais conforme o gosto do dona da casa.
Do
São João do passado, recorda a palavra de ordem “Um por todos para a canjica,
todos por um para o jenipapo”, quando a gurizada iniciava a romaria de casa em
casa.
No
São João dos velhos tempos a gente bebia, dançava e pulava fogueira, num ritual que motivava o surgimento de
compadres e comadres que muitos vezes até terminavam em casamentos com as graças de Santo
Antônio e a proteção de São João.
Exalto
o São João de tempos idos sem a pretensão de achar que a festa junina acabou e muito
menos o São João. A festa ainda existe, mas não tem a beleza do passado.
Aqui
na Feira, quando o São João já não motivava o intenso vai e vem das pessoas de
casa em casa, de rua em rua, o prefeito José Falcão, ainda no seu primeiro
mandato, no começo dos anos 70, fez do distrito de Maria Quitéria a sede da
grande festa junina.
Recordo
na entrada do distrito, pela Feira/Serrinha uma enorme placa de zinco com os seguintes dizeres: “Entre. Veja como é bonito o São João de São José”.
Com
o passar dos anos, mesmo nas gestões seguintes do próprio prefeito José Falcão,
o São João de São José foi perdendo as fogueiras, as quadrilhas, as mesas
fartas.
Na
imensa praça, além das barracas com
muita cerveja e quase nenhum tipo de licor, apenas um enorme palco armado para
a exibição de artistas famosos fazendo que estão interpretando as mesmas musicas
exibidas ao longo do ano nos programas de rádio e televisão.
Aliás,
mesmo nos poucos recintos fechadas onde a festa tenta resistir, no lugar das
canções contando “estórias” de Santo Antonio, São João e São Pedro, interpretadas
por Marines, Trio Nordestino ou mesmo pelos mestres mais recentes do período junino,
ouve-se musicas de duplo sentido como aquela que diz “Eu conheço a cara da mulher de pode”,
ou então “Eu nunca fui de mal com você...”. (Adilson Simas)
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