Por Luis Nassif
Narro isso em minha série "O caso de Veja", de
2008.
De repente, em seu programa Jô critica o ridículo de se
tratar qualquer avanço social como "boliviarismo", refere-se de forma
simpática a Fidel Castro e ao próprio Evo Morales. Na sequência, a Globo anuncia
o fim do público e do conjunto musical em seu programa, como parte de uma
estratégia de controle de custos.
Imediatamente, na blogosfera, Jô torna-se um herói da
resistência e a redução do seu programa é atribuído a represálias da Globo.
Volte-se a cena e recomece-se na ordem correta:
1. A Globo decide
reduzir os custos do programa de Jô e comunica a ele.
2. Jô rebela-se e,
no seu próprio programa, emite opiniões contrárias ao padrão Globo.
3. A notícia
torna-se pública.
Há alguns meses, a Globo enviou uma comitiva para percorrer
os principais grupos de mídia do mundo e definir uma estratégia para ela. As
recomendações foram na linha da redução drástica de custos, para enfrentar os
novos tempos.
Até então, o enorme poder de monopólio da Globo permitia-lhe
pagar um cast de artistas não aproveitados, apenas para impedir que fossem para
a concorrência. Do mesmo modo, comprava campeonatos esportivos que não
transmitia como filmes que não passava.
Esse mundo acabou. Ontem, foi anunciado o final do contrato
com Xuxa. Outros destratos se seguirão. Jornais e revistas passaram a abrir mão
de seu elenco de jornalistas, substituindo-os por uma infinidade de colunistas
ou de jovens repórteres.
Historicamente, o maior investimento dos grupos de mídia era
no seu cast. A imagem de atores, jornalistas, colunistas, cantores, era
construída como celebridade. Seu perfil não era de mortais comuns. Habitavam um
Olimpo e de vez em quando desciam à terra para palestras e confraternizações
rápidas com os humanos.
É verdade que, de manhã, tinham que pagar as contas, brigar
com os vizinhos, encrencar com as sogras como qualquer humano. Mas o modelo era
suficientemente restrito para ser seletivo: poucos deuses jornalistas, poucos
deuses atores.
De repente, chega a Internet não apenas colocando em xeque a
fórmula financeira dos grupos de mídia, mas explodindo com seu universo de
celebridades. Redes sociais, blogs dos mais variados, passam a construir seu
próprio Olimpo, banalizando o modelo, que sempre foi peça chave do alcance e da
influência dos grupos de mídia.
Décadas de investimento em colunistas, correspondentes,
atores, celebridades estão sendo jogadas fora devido ao esgotamento financeiro
do modelo tradicional de mídia.
Alguns jornalistas estão indo para a Internet, seguindo o
caminho dos pioneiros. Outros, buscando as assessorias de imprensa - algumas
delas com muito mais jornalistas do que as maiores redações.
Dia desses houve uma bela cerimônia de premiação de
jornalistas que reuniu várias gerações, dos anos 70 até os dias de hoje.
Tinha todo o ar de último baile da Ilha Fiscal. Alguns dos
premiados ousaram gritos de guerra contra as ameaças à liberdade de imprensa.
Deve ter sido um dos últimos episódios de solidariedade
entre jornalistas e empresas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário