Em artigo publicado no próprio Globo, o compositor Caetano Veloso, que se vestiu de black bloc durante as manifestações, defende o deputado Marcelo Freixo, do Psol, e diz estranhar a posição do jornal; "Simplesmente me pergunto qual exatamente será a intenção do GLOBO ao estampar manchetes e editoriais induzindo seus leitores a ligarem Marcelo Freixo aos rapazes que lançaram o rojão que matou Santiago Andrade. A matéria publicada no dia em que saiu a chamada de capa com o nome do deputado era uma não notícia", afirma
247 - O compositor Caetano Veloso, simpatizante do deputado Marcelo
Freixo, do Psol, publicou artigo neste domingo em que critica a postura do
jornal O Globo, para o qual colabora, em relação à morte do cinegrafista
Santiago Andrade. Leia abaixo:
Freixo outra vez
Gosto de Freixo não porque ele é do PSOL. Acho que gosto um
tanto do PSOL por ele abrigar Freixo. Sou independente, conforme se vê. Ser
estrela é bem fácil. Nada importam as piadas dos articulistas reacionários que
classificam minhas posições como Radical Chic. Desprezo a tirada de Tom Wolfe
desde o nascedouro. Antigamente tentavam me incluir na chamada esquerda
festiva. Isso sim, embora incorreto, me agradava: a expressão brasileira é
muito mais alegre, aberta e democrática do que a de Wolfe. Mas tenho vivido
para desmontar o esquema que exige adesão automática às ideologias da moda.
Deploro o resultado das revoluções comunistas. Todas. E, considerando o Terror
que se seguiu a 1789, sou cético quanto a revoluções em geral. Na maioria das
vezes, a violência se dá, não para fazer a história humana caminhar, mas para
estancar seu fluxo. Olho com desconfiança os moços que entram em transe
narcisista ao quebrar vidros crendo que desfazem a trama dos poderes. Ainda
hoje não consigo adotar a posição que considera Eduardo Gianetti, um liberal
crítico, ou André Lara Rezende, o homem que põe em discussão o crescimento
permanente, conservadores. Nem acho que o conservadorismo seja necessariamente
um mal. A adesão de alguns colegas meus à nova direita me deixa nauseado, não
por ser à direita, mas por ser automática.
Simplesmente me pergunto qual exatamente será a intenção do
GLOBO ao estampar manchetes e editoriais induzindo seus leitores a ligarem
Marcelo Freixo aos rapazes que lançaram o rojão que matou Santiago Andrade. A
matéria publicada no dia em que saiu a chamada de capa com o nome do deputado
era uma não notícia. Nela, a mãe de Fábio Raposo, o rapaz que entregou o
foguete a Caio Souza, é citada dizendo acreditar que o filho “tem algum tipo de
ligação com Freixo”. Isso em resposta a uma possível declaração do advogado
Jonas Tadeu Nunes, que, por sua vez, partiu de uma suposta fala da ativista
apelidada Sininho. O GLOBO diz que esta nega. Como então virou manchete a
revelação da possível ligação entre
o deputado e os rapazes envolvidos no trágico episódio? Eu
esperaria mais seriedade no trato de assunto tão grave.
Li o artigo do grande Jânio de Freitas em que ele defende a
tese de intenção deliberada de assassinar um jornalista, o que está em
desacordo com as imagens exibidas na GloboNews. Sem falar na entrevista do
fotógrafo, que afirma que o detonador do artefato tinha mirado os policiais.
Claro que me lembrei, ao ver a primeira reportagem na GloboNews, dos carros de
emissoras de TV incendiados durante as manifestações, o que me levou a
participar da indignação dos âncoras do noticioso. Um vínculo simbólico entre
aquelas demonstrações de antipatia e o ocorrido em frente à Central é óbvio: um
rojão sai das mãos de um manifestante e atinge a cabeça de um jornalista. Mas
parece-me abusivo ver nisso o propósito de matar o repórter. Nas matérias que
se seguiram, O GLOBO, ecoando falas do advogado Jonas Tadeu, que diz não ser
pago por ninguém para defender os dois réus mas conta que um deles diz receber
dinheiro para ir às manifestações, insiste em lançar suspeita sobre Freixo, por
ser o PSOL, seu partido, um possível doador do alegado dinheiro. Na verdade, as
declarações do advogado, mesmo nas páginas do GLOBO, soam inconvincentes. O
mesmo Jânio de Freitas, em artigo posterior àquele em que defende a tese de
assassinato deliberado, se mostra desconfortável com o comportamento de Jonas
Tadeu. Já O GLOBO, no qual detecto uma sinistra euforia por poder atacar um
político que aparentemente ameaça interesses não explicitados, trata as falas
de Tadeu sem crítica. Uma das manchetes se refere a vereadores do PSOL que
teriam contribuído para uma ação na Cinelândia, na véspera de Natal, sugerindo
ligação do partido com vândalos, quando se tratava de caridade com moradores de
rua. O tom usado no GLOBO é, para mim, de profundo desrespeito pela morte de
Santiago.
Freixo, em fala firme ao jornal, desmente qualquer ligação
com os dois rapazes. Ele também lembra (assim como faz Jânio) que Jonas Tadeu
representou o miliciano Natalino.
Quando Freixo era candidato a prefeito, escrevi artigo
elogioso sobre ele. O jornal fez uma chamada de capa que, a meu ver,
desqualificava meu texto. Manifestei minha indignação. A pessoa do jornal que
dialogava comigo me assegurou não ter havido pressão dos chefes. Acreditei. Agora
não posso deixar de me sentir mal ao ver a agressividade do jornal contra o
deputado. Tudo — incluindo os artigos de autores por quem tenho respeito e
carinho — me é grandemente estranho e faço absoluta questão de dividir essa
estranheza com quem me lê.
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